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Chapter 5 - O Espectador sem Dor

Ao ouvir a sentença de dez chicotadas seguida de três dias no Buraco dos Ratos, Fang Yan apenas sorriu. Era um sorriso de aceitação, quase de antecipação. A dor física era um preço pequeno a pagar pela informação que ele estava prestes a obter.

"Ótimo," ele disse, e começou a caminhar em direção ao poste de punição, que ficava no centro do pátio.

Enquanto caminhava, seu olhar varreu o chão de pedra. Por um instante, viu um objeto ligeiramente coberto por poeira e detritos: era um livro, com a capa de cor estranha e textura desgastada. Seus olhos escanearam a área, mas, mantendo a prioridade do momento, ele não se permitiu desviar a atenção. O livro seria verificado mais tarde, se ele sobrevivesse.

Ele chegou ao local e, sob o olhar atento dos discípulos e do Mestre Liang Hong, foi obrigado a retirar a parte de cima de suas vestes.

A revelação foi notável. Para um jovem que supostamente vivia uma vida pacífica no campo, Fang Yan possuía um corpo surpreendentemente forte. Seus ombros eram largos, e a musculatura era definida, sem ser exagerada — o corpo de alguém que, embora não cultivasse Qi ou tivesse treinamento marcial formal, realizava trabalho físico pesado e constante.

Ele foi posicionado em uma forca em forma de 'X' e preso por correntes pesadas nos pulsos e tornozelos. O encarregado da punição era um discípulo novato, jovem e claramente perturbado pela tarefa, especialmente após o assassinato do Ancião Wei.

O novato ergueu o chicote, mas sua mão tremeu. Ele hesitou.

Fang Yan percebeu a covardia e, aproveitando a oportunidade, mirou no ponto fraco do carrasco.

"Você é bem covarde, não é?" a voz de Fang Yan era um sussurro, mas ressoou no silêncio do pátio. "Entrou para esta Seita e está se tremendo por causa de uma punição. Acho que eu é que deveria estar tremendo, ou clamando por misericórdia, mas, vendo você, vejo apenas mais um covarde na toca dos leões."

Ele finalizou com um sorriso provocador, a expressão de puro desdém que era sua marca registrada.

O insulto funcionou como eletricidade. A hesitação do novato deu lugar à fúria e à vergonha. Aprovando a motivação, ele desceu o chicote com força.

A primeira chicotada rasgou a pele das costas de Fang Yan.

A segunda...

A terceira...

A punição seguiu implacável. A pele foi sendo puxada, rasgada e ensanguentada. O sangue começou a escorrer, manchando o chão de pedra e as correntes que o prendiam.

O Mestre Liang Hong assistia com a expectativa de ver a quebra ou, pelo menos, uma reação de dor sincera. Contudo, o que ele testemunhou foi estarrecedor: Fang Yan não gritava, não gemia, e não emitia qualquer som de angústia.

Liang Hong notou a tensão nos músculos faciais do jovem e o suor frio. Ele estava sentindo a dor, sem dúvida, mas estava a controlando com uma força de vontade que parecia sobre-humana para sua idade e falta de treinamento. A dor física era simplesmente rejeitada por sua mente.

A décima chicotada soou mais alta que as outras. Quando o chicote foi retirado, as costas de Fang Yan eram uma massa de carne lacerada e sangrenta.

Ele suspirou, um som longo e calmo, como se estivesse exausto após um exercício, e não torturado.

Foi então que o inacreditável aconteceu.

Enquanto o novato se afastava, aliviado, Fang Yan moveu sutilmente seus pulsos algemados, e de repente, ele se soltou das correntes. O som do metal caindo no chão ecoou no pátio.

O Mestre Liang Hong ficou confuso. As correntes eram à prova de fugas para qualquer um sem Qi. Ele olhou para Fang Yan, depois para as correntes caídas. Como ele havia feito isso?

O Mestre da Lâmina Negra estreitou os olhos e, por instinto, olhou para a cabeça do jovem.

Ele viu. Um pequeno acessório decorativo, disfarçado como um grampo de cabelo preso à sua trança. Não era apenas um adorno. Era uma ferramenta minúscula, extremamente fina, usada com precisão cirúrgica.

Um flash de compreensão atingiu Liang Hong.

Fang Yan havia usado o acessório para manipular os pinos internos ou o mecanismo das travas enquanto estava sendo chicoteado. Não só ele ignorou a dor da punição, mas usou o tempo para se libertar!

O Mestre da Lâmina Negra percebeu a verdade mais profunda:

Fang Yan não estava desmaiado na fazenda.

Ele não estava inconsciente quando foi jogado no chão da Seita, minutos atrás.

Ele estava perfeitamente acordado, ou, no mínimo, em um estado de consciência absoluta, fingindo a inconsciência para observar, planejar e executar seu ataque surpresa ao Ancião Wei. A única vez que ele esteve fora de combate foi o breve momento do soco na fazenda. Desde então, ele esteve em total controle, avaliando o ambiente e seus captores.

O sorriso no rosto do Mestre Liang Hong se ampliou, selvagem.

"Você é um belo demônio, garoto," murmurou ele, com um tom de admiração perversa.

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