Parte 1 – Acerto Final
O asfalto ainda fumegava após a explosão no armazém 24B. Sirenes ecoavam à distância, e o cheiro de ferrugem e pólvora se misturava ao ar denso da madrugada. Entre os escombros, duas silhuetas cambaleavam: Leprechaun e seu fiel capanga, cobertos de fuligem.
— Rápido, por aqui! — grunhiu Leprechaun, puxando o comparsa por uma escadaria lateral.
Subiram pela escada de emergência de um prédio vizinho até alcançarem um heliporto improvisado no topo. Um helicóptero os aguardava.
Do lado de fora da aeronave, os esperava Gabriel Moreau. Seus olhos frios varreram os dois fugitivos com desprezo.
— Chegaram vivos. Isso já é um começo.
O capanga tentou protestar:
— Tivemos que improvisar. Aquele maldito apareceu com a armadura…
Num único movimento, Moreau sacou uma pistola prateada e disparou um tiro seco no peito do homem, que caiu de joelhos, morto antes de tocar o chão.
Leprechaun olhou para Moreau, surpreso, mas sem medo.
— Desnecessário, Gabriel. Ele era leal.
Moreau deu de ombros, guardando a arma.
— Lealdade é um luxo que não podemos nos permitir, Leprechaun. Ele era um elo fraco, um risco. E você sabe que não tolero riscos. Além disso, já havia cumprido seu propósito.
— Então, o plano funcionou. Fúria Vermelha virou a nova obsessão da cidade.
Moreau riu — um som seco, sem humor.
— Exatamente como previsto. O caos era necessário para que a ordem — a minha ordem — fosse instaurada. As pessoas clamam por segurança, por um salvador. E a Astra Corporation estará lá para oferecer a solução.
— E Ethan McAllister? — perguntou Leprechaun, a voz baixa. — Ele era um obstáculo. Um idealista.
— Ethan era apenas uma peça no tabuleiro, nada mais. Sua morte foi um catalisador. A indignação pública, a busca por justiça… tudo pavimentou o caminho para a aceitação do projeto. E o sequestro da prefeita Harper? A cereja do bolo. Pânico, sensação de vulnerabilidade… tudo isso contribuiu para o objetivo. O caos em Hipton foi uma sinfonia. E eu fui o maestro.
— E eu? — rosnou Leprechaun. — Fiz o trabalho sujo. Tirei Grotto do caminho, queimei metade da cidade por você.
Moreau se aproximou de Leprechaun, o sorriso frio se desfazendo em um olhar de desprezo.
— Exato. E como toda ferramenta… você cumpriu seu papel.
Antes que Leprechaun pudesse reagir, Moreau sacou a pistola novamente e disparou um tiro certeiro em sua cabeça.
Sem expressão, o CEO virou-se para o piloto.
— Limpe isso.
Subiu no helicóptero. As luzes de Hipton tremeluziam abaixo enquanto a aeronave ganhava altura, levando consigo o arquiteto das sombras.
Parte 2 – Entre Cinzas e Esperança
Nos dias que se seguiram à explosão no armazém 24B e à subsequente descoberta do corpo de Leprechaun, Hipton começou, lentamente, a lamber suas feridas. A cidade, antes mergulhada no caos e no medo, respirava um alívio cauteloso. A notícia da morte do criminoso, embora envolta em mistério, trouxe uma paz que há muito não se via. As ruas, antes desertas após o anoitecer, começavam a ganhar vida novamente.
O funeral de Ethan McAllister foi um evento sombrio, mas digno. A cerimônia reuniu desde oficiais de alta patente até civis que o admiravam. Sob uma tenda preta, o caixão repousava coberto pela bandeira da cidade.
Ryan Dawson estava lá, com o rosto marcado pela dor e exaustão, mas com um brilho de determinação nos olhos. Ao seu lado, a prefeita Amelia Harper — ainda pálida e visivelmente abalada pelo sequestro — mantinha-se firme no propósito de reconstruir a cidade.
Gabriel Moreau também estava presente. Imponente em seu terno escuro, exibia uma expressão de pesar que parecia genuína aos olhos desatentos. Ofereceu suas condolências à ex-mulher e à filha de Ethan, e sua presença foi vista por muitos como um sinal do apoio da poderosa Astra Corporation à recuperação de Hipton.
Após a cerimônia, enquanto as pessoas se dispersavam, Ryan se aproximou da prefeita e de Moreau.
— Eu… preciso de um tempo — disse, com a voz embargada. — Vou passar alguns dias com meus pais em Commodore. Preciso clarear a cabeça, processar tudo isso.
— Você merece, Ryan. Hipton deve muito a você. Descanse. A cidade estará aqui quando você voltar.
Moreau, com um semblante sério, acrescentou:
— Entendo perfeitamente. A armadura sofreu danos consideráveis na explosão. Levará um tempo para reconstruí-la, aprimorá-la. Meses, talvez. Mas não se preocupe — nossos cientistas e engenheiros já estão trabalhando incansavelmente em uma nova versão. Fúria Vermelha retornará, mais forte do que nunca.
A menção à armadura despertava sentimentos mistos: alívio por se afastar do fardo, peso pela incerteza do futuro. Ryan se despediu e partiu, deixando para trás o cemitério e a promessa de um futuro incerto para Hipton e para Fúria Vermelha.
Parte 3 – Reinício
Após o funeral, a mente de Ryan era um turbilhão. Ele precisava de ar, de espaço para pensar. Subiu até a cobertura de um dos prédios mais altos da cidade. O vento frio da noite chicoteava seu rosto, mas ele mal sentia. Seus olhos varriam o horizonte, observando as luzes cintilantes de Hipton — uma cidade que ele havia jurado proteger, mas que agora parecia tão frágil e complexa.
Mesmo com a morte de Leprechaun, os escombros ainda marcavam a paisagem. Bairros inteiros reconstruíam-se lentamente. Sirenes tornaram-se parte da trilha sonora cotidiana. E o nome Fúria Vermelha surgia em muros, jornais, conversas — entre o medo e a esperança.
Ele fechou os olhos, recordando os momentos em que vestia a armadura: a sensação de poder, a adrenalina. Mas também se lembrava da dor, da solidão e do peso da responsabilidade. Ser Fúria Vermelha era um fardo. Um sacrifício. E agora, com a chance de se afastar, de viver uma vida normal, a tentação era forte. Ele poderia ir para Commodore, descansar, talvez nunca mais voltar. Deixar Hipton para se curar sozinha, encontrar sua própria força.
Abriu os olhos. Fitou a cidade adormecida.
O futuro era incerto, sim. Mas uma coisa era clara: o heroísmo de Ryan não estava morto. Apenas hibernando.
E quando despertasse, seria em um novo campo de batalha — em Commodore, onde o próximo capítulo de sua saga o aguardava. O mistério pairava no ar, como uma promessa de novos desafios. E uma jornada que estava apenas começando.