Lívia estava acostumada a não ser vista.
Ela caminhava pelos corredores da Vasconcellos Corp com uma pasta firme contra o peito, postura profissional e passos silenciosos. Era sempre assim. Funcionária exemplar, eficiente, pontual. Invisível.
Ninguém reparava na forma como ela resolvia problemas antes mesmo de se tornarem crises. Ninguém elogiava sua inteligência. Ninguém perguntava como ela estava.
E ela já tinha aceitado isso.
Naquela manhã, o prédio fervilhava. Sussurros cruzavam o ar, saltos apressados ecoavam no mármore e olhares nervosos surgiam a cada elevador que se abria.
— Ele chegou — alguém cochichou.
Lívia nem precisou perguntar quem.
Eduardo Vasconcellos.
O CEO raramente aparecia na matriz. Quando aparecia, causava exatamente aquele efeito: tensão, expectativa, vaidade exagerada. Mulheres ajustavam roupas, homens endireitavam gravatas. Todos queriam ser notados.
Ela não.
Lívia sabia que não fazia parte desse jogo.
Entrou na sala de reuniões para deixar documentos e saiu antes que alguém pudesse pedir algo. Era assim que sobrevivia: ocupando pouco espaço.
— Senhorita Monteiro.
A voz grave a atingiu pelas costas.
Lívia congelou.
Aquilo não acontecia. Ninguém a chamava. Muito menos ele.
Virou-se devagar, o coração acelerado de um jeito quase doloroso.
Eduardo estava parado no centro da sala, alto, imponente, terno sob medida. Os olhos escuros pousaram nela como se o resto do mundo tivesse desaparecido.
— Sim, senhor? — respondeu, engolindo em seco.
Ele a observou por alguns segundos longos demais. Não com desdém. Não com piedade. Com atenção.
— Foi você quem organizou o relatório financeiro do último trimestre?
— Fui eu — respondeu, surpresa.
— Está impecável.
Uma única palavra. Simples. Direta.
Impecável.
Lívia sentiu algo estranho se formar dentro do peito. Algo quente. Algo perigoso.
— Obrigada — murmurou, sem saber o que fazer com aquele olhar que não se afastava.
Eduardo deu um passo à frente. Apenas um. Mas foi o suficiente para desestabilizá-la.
— Preciso de você na minha equipe direta a partir de hoje.
O mundo pareceu inclinar.
— Senhor… acho que houve um engano — ela disse, quase rindo de nervoso. — Deve haver alguém mais… adequada.
O olhar dele escureceu.
— Não houve engano algum. Eu sei exatamente quem estou escolhendo.
Escolhendo.
Ninguém nunca havia usado aquela palavra em relação a ela.
Eduardo se aproximou mais um pouco, a voz baixa, firme:
— Você se subestima, Lívia Monteiro. E isso vai mudar.
Ela sentiu o rosto queimar. O coração bater descompassado.
— Eu não…
— Não discuta — interrompeu, sem dureza, apenas certeza. — Apresente-se na minha sala às nove amanhã.
Ele se afastou como se nada tivesse acontecido, deixando para trás uma Lívia completamente desestruturada.
Ela ficou ali, parada, tentando entender por que, entre tantas opções, o CEO mais poderoso do país havia olhado para ela.
E, pela primeira vez na vida, Lívia sentiu algo assustador nascer dentro de si.
Esperança.
Mas o que ela não sabia…
era que aquele olhar não tinha sido profissional.
Era o começo de algo que mudaria tudo.